O sobrepeso e a obesidade são fatores de risco para o desenvolvimento de diversas doenças crônicas, incluindo diabetes tipo 2, hipertensão arterial, doença cardiovascular e câncer, as quais afetam milhões de pessoas no mundo anualmente.

A facilidade com que um indivíduo ganha peso pode ser influenciada por sua composição genética. 

Variações genéticas no gene chamado FTO são associadas com alterações de peso e gordura corporal (IMC e Relação cintura/quadril), marcadores metabólicos (colesterol total, triglicerídeos, glicemia de jejum) e adipocinas (hormônios, incluindo adiponectina e leptina).

Entendendo o gene FTO

O gene FTO codifica uma enzima dioxigenase, que atua por meio de demetilação oxidativa nas moléculas de DNA e RNA.

Essa proteína é altamente expressa no cérebro, principalmente nas regiões do hipotálamo e pituitária, ambos locais essenciais para a regulação do balanço energético. 

A variação rs9939609 no gene FTO apresenta 3 genótipos possíveis: T/T, A/A, T/A. Ambos os genótipos A/A e T/A apresentam risco 31% maior para elevação de gordura corporal, quando comparados ao genótipo T/T. Esse efeito deve-se em parte, pela alteração no consumo alimentar e no gasto energético.

FTO e consumo alimentar

Segundo a literatura, os indivíduos com genótipo T/A tendem a consumir em média 120 kcal/dia a mais que os de genótipo T/T. Já os que tem genótipo A/A tendem a ter consumo calórico aumentado em 294 kcal/dia em relação as pessoas com genótipo T/T. 

Além de aumentar o consumo calórico, o FTO também aumenta significativamente a sensação de fome, diminui a saciedade, e aumenta a dificuldade em ignorar os sinais fisiológicos de fome (esvaziamento gástrico, fadiga, dores de cabeça etc.).

Os mecanismos exatos para esses efeitos não são totalmente compreendidos, mas possivelmente há uma conexão com alterações na via de sinalização do hormônio chamado leptina.  

A leptina é um hormônio secretado pelo tecido adiposo branco que tem função de regular fome e gasto calórico. Níveis plasmáticos elevados de leptina têm sido associados ao aumento do percentual de gordura corporal.

Além disso, estudos mostram que uma maior liberação do hormônio grelina leva a diminuição da capacidade do cérebro em controlar sinais/sensações de fome (fraqueza, tremores, estômago roncando etc) e, portanto, geram aumento no consumo alimentar. Este é outro possível mecanismo de ação do gene FTO.

FTO e consumo de gordura

Segundo dados da literatura, em indivíduos com a presença do alelo A no gene FTO o consumo de elevada quantidade de gordura na dieta (mais de 30 % das calorias diárias) favorece o aumento da adiposidade (acúmulo de gordura). Por outro lado, quando o consumo de gordura é baixo, esse efeito não é percebido.  

Dessa maneira, nos indivíduos que apresentam a variante do FTO, dietas com menor teor de gordura são positivas para a manutenção de níveis corporais de gordura mais baixos. (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27514607/)

Outro fator importante é o tipo de gordura consumida. Os portadores do alelo A que consomem mais de 12,6% de gordura saturada na dieta (em relação a quantidade total de calorias diárias) apresentam risco aumentado de obesidade quando comparados aos indivíduos que não possuem o alelo A (FTO TT).

Outro fato interessante já demonstrado na literatura, é que os indivíduos com presença do alelo A (variante) que apresentam peso eutrófico, o consumo de gorduras poli-insaturadas em relação as monoinsaturadas é maior. Ou seja, um maior consumo de gorduras poli-insaturadas parece ser benéfico para a manutenção do peso nesses indivíduos. (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21798115/)  

FTO e consumo de carboidratos e proteínas

Outro estudo demonstrou que indivíduos portadores do alelo A que consumiam mais carboidratos na dieta e menos gordura, tinham menor IMC (menor risco para desenvolver sobrepeso e obesidade). (https://academic.oup.com/ajcn/article/90/5/1418/4598172)

Interessantemente, nesse estudo também foi visto que nos indivíduos que tinham dieta rica em proteína, o IMC era maior. Ou seja, o consumo excessivo de proteínas também tende a favorecer ganho de peso nesses indivíduos.

FTO e exercício físico

A prática regular de exercícios físicos também é fator crítico para a manutenção do peso saudável em portadores do alelo A do gene FTO. Segundo a literatura, os efeitos da variação do FTO só são observados nos indivíduos que não praticam quantidades adequadas de exercício físico. (https://academic.oup.com/ajcn/article/90/5/1418/4598172)

Estudo feito com adolescentes demonstrou que aqueles que faziam pelo menos 60 minutos de atividades físicas de intensidade moderada ou alta por dia, o alelo A não apresentava associação positiva com o aumento do IMC, com a gordura corporal e nem com a circunferência da cintura. Já aqueles que faziam menos de 60 min/dia de exercícios moderados ou intensos, os efeitos do gene ainda podiam ser percebidos. (https://jamanetwork.com/journals/jamapediatrics/fullarticle/383015)

Um outro estudo, feito com adultos, mostrou que para cada cópia do alelo A o risco de sobrepeso ou obesidade aumenta em 32%. Ou seja, as pessoas que apresentam os dois alelos A tem risco 64% maior para ganho de peso, em relação a quem não apresenta. Esse efeito, no entanto, é modulado, segundo o estudo, por exercício físico.

Os indivíduos que praticaram mais de 300 minutos semanais de exercício físico (intensidade moderada-alta) apresentaram diminuição de 85% entre o FTO e o IMC e uma diminuição de 118% na associação com circunferência abdominal, quando comparados a indivíduos que faziam menos de 150min de exercício na semana.

Ou seja, 150 minutos semanais de exercício físico são a quantidade para que os efeitos do gene comecem a ser silenciados. O melhor resultado, no entanto, é observado quando esse tempo aumenta para 300 minutos semanais. (https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/oby.21422)

Considerações finais

O gene FTO possui um impacto significativo com relação à saciedade e ao ganho de peso. No entanto, estratégias alimentares aliadas a prática regular de exercício físico favorecem o controle dessas características genéticas, proporcionando a manutenção de um peso saudável.