O que é microbiota intestinal?

O termo microbiota intestinal refere-se ao grupo de pequenos organismos que vive no nosso intestino. Em humanos, o trato gastrointestinal contém mais de 100 trilhões de micro-organismos (cerca de 2,5kg) sendo que cada pessoa possui uma composição de microbiota único!

A microbiota intestinal é composta por ampla variedade de bactérias, vírus e leveduras. E, quando em equilíbrio, esses micro-organismos podem nos proteger contra o desenvolvimento de várias doenças, como diabetes, depressão, obesidade e doenças autoimunes, por exemplo.

Funções da microbiota

A microbiota intestinal desempenha funções regulatórias essenciais para a nossa saúde, como por exemplo, regulam a digestão, ajudam a extrair, sintetizar e absorver diversos nutrientes e metabólitos como, por exemplo, ácidos biliares, aminoácidos, vitaminas e ácidos graxos de cadeia curta.

A microbiota intestinal também tem papel imunológico decisivo na proteção contra infecção e crescimento de bactérias patogênicas e protegendo a camada de células intestinais contra lesões chamadas de hiperpermeabilidade intestinal.

Além disso, a microbiota intestinal atua regulando o desenvolvimento e a função de células do sistema imunológico no intestino, refletindo assim, na regulação de processos e doenças inflamatórias, como síndrome do intestino irritável e doença de Crohn, por exemplo. 

Bactérias dentro do intestino delgado, o conceito, a representação.
Bactérias dentro do intestino delgado, o conceito, a representação.

Quem são as bactérias que formam a microbiota?

Categoricamente, as bactérias podem ser classificadas em grupos, dentre os quais temos o filo, o gênero e a espécie.

Os filos predominantes na microbiota intestinal de indivíduos adultos são os Firmicutes e os Bacteriodetes, que chegam a representar 90% do total das bactérias. Em seguida, estão os filos Actinobacteria, Proteobacteria, Fusobacteria e Verrucomicrobia, presentes em proporções bem menores.

O filo Firmicutes é composto por mais de 200 gêneros diferentes de bactérias dentre os quais estão os Lactobacillus, Bacillus, Clostridium, Enterococcus, and Ruminicoccus.

O filo dos Bacterioidetes é composto predominantemente pelos gêneros Bacteroides e Prevotella.

Já o filo Actinobacteria, consideravelmente menos abundante, é basicamente representado pelo gênero Bifidobacterium.

Fatores que influenciam na composição da microbiota

São muitos os fatores que afetam a composição da microbiota de uma pessoa, incluindo região anatômica do trato gastrointestinal, idade gestacional, tipo de parto e de amamentação, introdução alimentar, idade e uso de antibióticos.  

Science Talks – Microbioma

Região anatômica

Cada região anatômica do trato gastrointestinal apresenta características fisiológicas distintas, como pH, quantidade de oxigênio disponível, velocidade de digestão, secreções gástricas etc. Estas condições, propiciam o crescimento de diferentes tipos de bactérias, de acordo com as preferências de ambiente.

Idade gestacional

Outro fator importante é idade gestacional, ou seja, com quantas semanas de vida o individuo nasceu. Crianças que nasceram com menos de 37 semanas de gestação tendem a ter uma composição diferente de microbiota quando comparadas as que nasceram com mais de 37 semanas.

Tipo de parto

O tipo de parto também afeta a composição da microbiota. Quando o parto é vaginal, a microbiota do recém-nascido tem composição semelhante a microbiota do canal vaginal da mãe. Já nos partos de cesárea, e microbiota do bebê é mais parecida com a microbiota da pele da mãe e do ambiente hospitalar, apresentando menor diversidade de bactérias, quando comparado ao parto vaginal.

Aleitamento materno

Outro fator importante é o tipo de aleitamento. Crianças que receberam aleitamento materno apresentam 2x mais Bifidobacterium do que crianças que receberam fórmulas infantis. Vale ressaltar que, a composição da microbiota intestinal da mão durante a fase de amamentação é também considerada um fator importante, pois a mesma influência na composição da microbiota presente no leite materno.

Mãe com bebê menino amamentando em casa
Mãe com bebê menino amamentando em casa

Introdução alimentar

Após a amamentação exclusiva, chega o período de introdução de alimentos sólidos. E essa fase é a que traz as mudanças mais profundas na composição da microbiota. É nesse período que a composição da microbiota de crianças que receberam leite materno e crianças que receberam fórmulas infantis começa a ficar mais parecida.

As práticas alimentares durante a fase de introdução alimentar são determinantes nas variações estabelecidas na microbiota de um indivíduo. A introdução de alimentos ricos em carboidratos e fibras causam aumento de Firmicutes e Prevotella, enquanto a prevalência no consumo de alimentos ricos em fibra e de origem animal propiciam maior aumento de Bacteroidetes. 

Idade

A diversidade da microbiota também muda conforme a idade. Com cerca de 3 anos de idade a composição e a diversidade da microbiota das crianças é muito semelhante a dos adultos. Já pessoas com mais de 70 anos, podem sofrer alteração na composição da microbiota devido a mudanças na capacidade digestiva e de absorção de nutrientes, e também diminuição da atividade do sistema imune. Hábitos alimentares mais monótonos também podem diminuir a diversidade da microbiota.

Uso de antibióticos

A variabilidade da microbiota de um indivíduo pode também ser afetada pelo uso de antibióticos. Segundo a literatura, o uso de antibióticos pode levar ao aumento na abundância e no aparecimento de certas espécies, bem como, na diminuição e no desaparecimento de outras. O efeito do antibiótico varia de acordo com fatores como, por exemplo, seu mecanismos de ação, suas propriedades farmacologias, dose, período e tempo de uso.

Enterotipo

Enterotipos são associações harmônicas funcionais entre diferentes tipos de bactérias que predominam na microbiota intestinal de uma pessoa. Três enterotipos são caracterizados pela predominância de três grupos de bactérias.

Enterotipo I – predominância de Bacteroides;

Enterotipo II – predominância de Prevotella;

Enterotipo III – predominância de Ruminococcus.

Cada enterotipo possui características especificas, se mantem estável durante a vida adulta e, pode ser reestabelecido caso sofra modificação (uso de antibióticos, por exemplo).

Além disso, cada enterotipo possui características funcionais distintas, sendo que o enterotipo I produzem energia primariamente a partir de carboidratos fermentáveis, enquanto os enterotipos II e III são capazes de degradar mucina e glicoproteínas (proteínas) da camada mucosa da intestino.

Aparentemente, o principal fator responsável por determinar o enterotipo de um indivíduo são os seus hábitos alimentares.

Índice de massa corporal (IMC)

O IMC representa um valor preditivo valido para detecção de alterações na composição da microbiota. Estudos da literatura têm demonstrado associação positiva entre aumento de IMC e aumento da diversidade bacteriana no intestino, bem como, o contrário.

A microbiota de indivíduos obesos (IMC elevado) apresenta aumento na relação Firmicutes / Bacteriodetes, quando comparada a microbiota de indivíduos eutroficos.

Vale ressaltar, que um estudo feito com mulheres anoréxicas e, portanto, com IMC muito baixo, também demonstrou fortes variações na composição da microbiota, quando comparadas a mulheres com IMC eutrofico, sendo os principais achados aumento significativo de Enterobacteriaceae e Methanobrevibacter smithii, e diminuição de Roseburia, Ruminococcus e Clostridium.

Hábitos alimentares

Apesar de ser relativamente estável em indivíduos adultos saudáveis, a microbiota pode ser influenciada por estilo de vida e hábitos alimentares. Estudos comparando o padrão alimentar tipicamente ocidental de populações européias (consumo elevado de gordura e proteína animal e baixo em fibras) com populações rurais isoladas, como algumas tribos africanas (alto consumo de grãos/cereais e vegetais e baixo consumo de proteína e gordura animal) mostram a existência de diferenças significativas entre esses dois padrões alimentares.

Interessantemente, quando o padrão alimentar é modificado, por exemplo, quando o consumo de uma dieta rica em gordura e proteína animal é substituído por uma dieta a base de plantas, a composição da microbiota é muda também.

Exercício físico

Outro fator importante é o exercício físico. Estudos mostram que exercício físico diário aumenta a diversidade da microbiota intestinal, bem como a concentração de bactéria produtoras de substâncias anti-inflamatórias no intestino.

Dessa forma, podemos perceber que a composição da microbiota é influenciada por diversos fatores ao longo da nossa vida. Alguns deles podem ser mais facilmente controlados, como dieta e exercício físico. Já outros, nem tanto, como tipo de parto, amamentação e uso de medicamentos.

Quando conhecemos a composição da nossa microbiota intestinal, conhecemos um pouco mais de nós mesmos e da nossa história. Cultivar uma relação positiva com essa vasta comunidade de bichinhos que habita nosso intestino é essencial para a nossa saúde e bem-estar.

Fonte: RINNINELLA, E. et al. What is the Healthy Gut Microbiota Composition? A Changing Ecosystem across Age, Environment, Diet, and Diseases. Microorganisms. 2019 Jan; 7(1): 14.