consumo crônico de álcool é um fator de risco para a saúde e o consumo nocivo e crônico resultou em 5,3% das mortes em todo o mundo em 2016. Das doenças associadas ao álcool, as doenças gastrointestinais ocuparam 21,3% das mortes. 

Os efeitos danosos que o álcool (etanol) provoca no intestino delgado e grosso são denominados de Doença Intestinal Associada ao Álcool (DIAA) e inclui o câncer de cólon associado ao álcool. A DIAA pode incluir alterações patológicas no intestino, como intestino permeável (com translocação de produtos microbianos), alterações no epitélio intestinal, disfunções imunológicas intestinais com redução de células de defesa e alterações no microbioma intestinal.

O etanol é absorvido no Trato Gastrointestinal (TGI) por difusão simples, ou seja, ele simplesmente passa a camada de células intestinais e é levado para a corrente sanguínea. O etanol pode ser metabolizado pelas células intestinais devido a presença da enzima álcool desidrogenase (ADH), mas a grande metabolização do etanol ocorre no fígado

No intestino delgado proximal o etanol reduz o transporte ativo de nutrientes através do epitélio, como monossacarídeos e resíduos de aminoácidos e lipídeos, assim como algumas vitaminas. O comprimento das vilosidades intestinais é reduzido em indivíduos que consomem bebida alcoólica em excesso em comparação com indivíduos saudáveis. Com a abstinência alcoólica, a elevada capacidade regenerativa do epitélio intestinal pode reparar esta deficiência absortiva. Normalmente as maiores alterações intestinais em indivíduos que consomem excesso de álcool ocorrem no intestino delgado proximal, que é a região com maior absorção de álcool. O etanol e seu metabólitos acetaldeído e o acetato estão implicados na má absorção e disfunções no intestino delgado proximal, intestino distal e cólon.

No fígado o etanol pode ser convertido em acetaldeído através de três vias diferentes: (1) pela enzima álcool desidrogenase (ADH), localizada no citosol dos hepatócitos, é a principal via do metabolismo do etanol, converte NAD+ em NADH+; (2) pela enzima catalase, que está localizada nos peroxissomos dos hepatócitos, metaboliza o etanol em acetaldeído pela conversão de H2O2 em 2H2O e (3) pela ação do citocromo P450-2E1, nos microssomas, mas que só será ativada de forma significativa com o consumo crônico excessivo de álcool e leva a produção de espécies reativas de oxigênio (ERO). O metabolismo de etanol em indivíduos que abusam de álcool gera ERO e peroxidação lipídica, depleção de enzimas antioxidantes, como a glutationa mitocôndrial e depleção S-adenosilmetionina, todos estes leva o hepatócito à lesão.

A diagram of the digestive system

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Figura 1. Apresentação esquemática representando o metabolismo do etanol no trato gastrointestinal. Fonte: MACCIONI et al. (2023).

O excesso de acetaldeído liga-se de forma covalente aos microtúbulos nos hepatócitos, resultando na retenção intracelular de proteínas que normalmente são excretadas, o que gera inchaço celular. O acetaldeído é um composto extremamente reativo, muito tóxico para as células do fígado, pois reage com proteínas e com o DNA levando a redução dos níveis de glutationa, peroxidação lipídica e dano mitocondrial.

O acetaldeído é metabolizado a acetato pela enzima acetaldeído desidrogenase 2 (ALDH2). Embora o acetato não tenha hepatotoxicidade direta, ele pode alterar a resposta inflamatória. O acetato é um ácido graxo de cadeia curta também produzido por bactérias intestinais no cólon e pode moldar diferentes funções na barreira intestinal. No intestino delgado e grosso a atividade da ALDH2 é relativamente menor quando comparada à atividade da ADH, resultando potencialmente no acúmulo de acetaldeído neste tecido. Este acúmulo pode resultar em ruptura da barreira intestinal e levar ao câncer. O risco de desenvolvimento de câncer colorretal (CCR) está associado ao acúmulo de acetaldeído, além do estresse oxidativo e fatores genéticos e ambientais. O consumo excessivo de álcool está associado ao aumento de 1,5 vezes no risco de CCR. 

O consumo de álcool e seus metabólitos contribuem para a formação de ERO e espécies reativas de nitrogênio nas células intestinais, gerando danos na mucosa e no DNA, o que potencialmente pode iniciar a transformação celular maligna. O acetaldeído causa várias modificações no DNA, incluindo mutações e instabilidade cromossômica, quebra de fita de DNA, hiperproliferação de células da cripta do cólon e desenvolvimento de CCR. A ingestão crônica de álcool promove metástase CCR. Há evidências que relacionam as enzimas metabólicas do álcool desempenhando um papel fundamental na iniciação do tumor e na manutenção das células cancerosas no CCR. 

Os polimorfismos* para os genes ADH1B e ALDH2 correlacionaram-se com a carcinogênese colorretal, sendo que ADH1B foi dramaticamente regulado positivamente no adenocarcinoma de cólon. O álcool facilita a fuga do tumor contra a defesa do sistema imunológico. A redução ou a interrupção do consumo de álcool podem ser indicados para quem possui polimorfismos relacionados ao gene ADH1B. Nós, da Biogenetika, temos como missão o cuidado integrativo e individualizado da saúde, neste sentido disponibilizamos no BioDiet Plus a análise genética do polimorfismo do gene ADH1B.

O consumo indevido de álcool causa ruptura de proteínas de junção estreita (tight junction) e elevação da permeabilidade intestinal, principalmente no intestino delgado proximal pela ação do acetaldeído e acetato. As células de Paneth desempenham papel importante na manutenção da integridade da barreira intestinal liberando peptídeos antimicrobianos que são reduzidos pelo uso abusivo de álcool, o que se relaciona com o aumento de bactérias no intestino duodeno.

O consumo crônico de etanol reduz a resposta imunológica intestinal, e um dos mecanismos associados é a potencial atividade de acetilação/desacetilação de histonas em macrófagos intestinais com diminuição das citocinas pró-inflamatórias e regulação inata, assim como a redução de células T de defesa com redução da imunovigilância contra microrganismos ocasionada provavelmente pelo aumento de esfingolipídeos duodenais.

microbiota intestinal se relaciona diretamente com a metabolização de nutrientes, inclusive, algumas espécies de bactérias láticas intestinais e leveduras possuem a capacidade de produzir etanol a partir de frutoligossacarídeos (FOS) em condições anaeróbicas. Mais estudos são necessários para compreender se as bactérias produzem etanol no intestino humano. Mas elas podem converter etanol em acetaldeído através da ADH microbiano ou da catalase, o que pode aumentar ainda mais as concentrações intestinais de acetaldeído em indivíduos que consomem de forma excessiva o álcool. A microbiota tem capacidade reduzida de metabolizar acetaldeído em acetato, favorecendo o acúmulo de acetaldeído no intestino. O álcool pode alterar a composição do microbioma e aumentar a chance de translocação microbiana, alterando a resposta do sistema imunológico. 

Você pode entender como o seu microbioma intestinal se relaciona com o consumo de álcool através da análise da composição individual e específica do microbioma realizando o Trigger Microbioma por Shotgun da Biogenetika.

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*Conceito de polimorfismo: são as variações na sequência de DNA que podem alterar as proteínas produzidas pelo organismo podendo gerar impactos para as vias envolvidas, metabolismo e saúde de quem as porta. Para ser considerado um polimorfismo esta variação precisa ser de no mínimo 1% em uma população.