O câncer de próstata é a segunda principal causa de câncer entre os homens em todo o mundo, perdendo apenas para o câncer de pulmão. É uma doença altamente hereditária, com até 60% do risco associado a fatores genéticos herdados. Assim como em outros tipos de câncer, como o de mama e cólon, o câncer de próstata frequentemente apresenta agrupamentos familiares, especialmente em casos associados a variantes genéticas de alta ou moderada penetrância. Essas variantes não apenas contribuem para o desenvolvimento da doença, mas também oferecem oportunidades para estratégias de triagem e prevenção personalizadas.

É importante esclarecer que a compreensão do papel da genética no câncer de próstata está em constante evolução. Desde a identificação de variantes raras e altamente prejudiciais até a criação de scores de risco poligênico baseados em múltiplos polimorfismos comuns, os avanços científicos têm moldado a forma como lidamos com a doença. 

Entre os principais fatores de risco estão a idade avançada, a história familiar e a ancestralidade africana, que aumenta tanto o risco de desenvolvimento quanto a agressividade do tumor. Homens com parentes de primeiro grau (pai ou irmão) diagnosticados com câncer de próstata têm um risco 2 a 3 vezes maior de desenvolver a doença. Já a herança de mutações genéticas específicas pode elevar ainda mais esse risco.

Dessa forma, a avaliação genética tem se tornado uma peça-chave no manejo do câncer de próstata, principalmente em indivíduos com histórico familiar ou características clínicas específicas. Essa abordagem não apenas identifica mutações hereditárias que aumentam o risco, mas também possibilita uma medicina personalizada, orientando tanto o diagnóstico precoce quanto as estratégias de tratamento e prevenção. Os resultados desses testes podem orientar estratégias personalizadas de triagem, como a realização de exames de PSA em idades mais precoces, o uso de ressonância magnética multiparamétrica para detecção de lesões suspeitas, bem como o monitoramento mais frequente ou mesmo, intervenções antecipadas.

Mas o que os testes genéticos avaliam no DNA?

Os testes genéticos para o câncer de próstata analisam duas principais categorias de alterações no DNA: as mutações germinativas, que são aquelas alterações hereditárias presentes em todas as células do corpo e transmitidas de uma geração para outra; e as mutações somáticas, que são aquelas alterações que ocorrem no DNA ao longo da vida, especificamente no tecido tumoral.

No caso da avaliação das alterações germinativas, estas podem ser classificadas em dois grandes grupos: mutações patogênicas e polimorfismos genéticos (SNPs), cada um com características e impactos distintos.

As mutações patogênicas ou provavelmente patogênicas são alterações raras no DNA que têm um impacto significativo na função do gene, frequentemente resultando em perda total ou parcial da sua atividade. Elas podem ser causadas por  substituições de nucleotídeos, onde um único nucleotídeo é alterado, causando uma mudança na sequência de aminoácidos ou até mesmo a interrupção da produção da proteína; deleções ou inserções, onde trechos de DNA são removidos ou adicionados, gerando proteínas truncadas ou não funcionais, ou ainda, rearranjos estruturais que são alterações maiores, como translocações ou inversões, que podem alterar completamente a função do gene. Essas mutações conferem um risco elevado e estão diretamente associadas a síndromes hereditárias ou a casos mais agressivos de câncer de próstata. Exemplos de genes que frequentemente apresentam essas mutações incluem BRCA2HOXB13CHEK2 e os genes da síndrome de Lynch (MLH1, MSH2, MSH6, PMS2).

        Já os Polimorfismos de Nucleotídeo Único (SNPs) são variações comuns no DNA (encontrados em uma alta porcentagem da população) e caracterizadas pela troca de um único nucleotídeo em uma posição específica do genoma. Os estudos de associação genômica ampla (GWAS) têm identificado mais de 250 SNPs relacionados ao risco de câncer de próstata. Esses SNPs estão distribuídos em diversas regiões do genoma e, individualmente, conferem um aumento modesto no risco. No entanto, a combinação de múltiplos SNPs em análises, como os scores de risco poligênico (PRS), contribui de forma significativa para a estratificação do risco.

E quais são os genes relacionados ao câncer de próstata?

No caso dos SNPs, alguns dos mais estudados são aqueles próximos à região 8q24, um “hotspot” genético no braço longo do cromossomo 8. Esta região é considerada um “hotspot” porque contém diversas variantes genéticas associadas ao risco aumentado de vários tipos de câncer. Também SNPs em regiões que influenciam genes regulatórios como o MSMB (beta-microseminoproteína) que está envolvido na supressão de tumores na próstata. Da mesma forma, polimorfismos no gene KLK3, que codifica o PSA (antígeno prostático específico), um marcador utilizado no diagnóstico e monitoramento do câncer de próstata também são analisados.

        Além dos SNPs, genes de alta e moderada penetrância também estão fortemente associados ao câncer de próstataOs genes BRCA1 e BRCA2, por exemplo, embora mais conhecidos por seu papel no câncer de mama e ovário, quando alterados aumentam consideravelmente o risco de câncer de próstata. Homens com mutações no BRCA2, em particular, têm maior probabilidade de desenvolver tumores agressivos e letais. O gene HOXB13 desempenha um papel na regulação da transcrição e desenvolvimento da próstata e uma mutação G84E (que se refere-se a substituição de uma glicina por um ácido glutâmico na posição 84 da cadeia proteica) nele apesar de rara, está fortemente associada a um risco aumentado, especialmente em famílias com histórico de câncer de próstata. Além destes, genes envolvidos na reparação do DNA como o ATM, CHEK2 e PALB2, quando mutados, prejudicam a integridade genômica, aumentando a probabilidade de desenvolvimento de tumores.

Hoje sabe-se também que homens com mutações nos genes de reparo de incompatibilidade de DNA, como o MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2, têm maior risco de desenvolver câncer de próstata e devem ser avaliados cuidadosamente, especialmente se houver histórico de câncer colorretal ou outros tumores associados à síndrome de Lynch na família. Outros genes de risco envolvem genes como NBN, relacionado à estabilidade genômica, e TP53, amplamente conhecido por seu papel em múltiplos tipos de câncer. 

Embora a genética desempenhe um papel importante no risco de câncer de próstata, fatores modificáveis também são relevantes. A adoção de um estilo de vida saudável pode ajudar a reduzir a probabilidade de desenvolvimento da doença, mesmo em indivíduos com predisposição genética. Afinal, um diagnóstico de um teste genético não é uma sentença, apenas indica uma probabilidade de que a doença ocorra e deve ser encarado como uma ferramenta de autoconhecimento e prevenção.

Podemos concluir então que o câncer de próstata é uma doença multifatorial, em que a interação entre predisposição genética e fatores ambientais desempenha um papel crucial. E que, com os avanços dos testes genéticos e a identificação de variantes associadas ao risco, é possível personalizar estratégias de triagem e prevenção, oferecendo melhores perspectivas para homens em risco. Adotar hábitos de vida saudáveis e realizar avaliações regulares são passos fundamentais para a detecção precoce e controle da doença.

“Este texto foi elaborado com base em informações do material ‘Genetics of Prostate Cancer (PDQ®)’ – Health Professional Version, do National Cancer Institute (NCI), uma das principais referências globais em oncologia, reconhecida por sua precisão e atualidade científica.”