O cálcio exerce papel fundamental em diversas funções biológicas e está associado a distúrbios do metabolismo ósseo e à mortalidade cardiovascular. Enquanto 99% do cálcio está armazenado nos ossos e dentes, cerca de 1% circula no sangue e está envolvido em diversos processos fisiológicos, sendo uma molécula de sinalização universal. 

Por atuar no potencial de membrana, é essencial para contração muscular, regulação da frequência cardíaca e geração de impulsos nervosos. Níveis elevados de cálcio sérico estão associados a um maior risco cardiovascular. Também participa do transporte de íons e muitos outros processos celulares, como a coagulação sanguínea e mineralização de ossos e dentes. O nível de cálcio sérico está sob rigoroso controle hormonal, principalmente os sistemas hormonais da paratireoide e vitamina D, variando entre 2,15 a 2,55 mmol/L (8,5 a 10,5 mg/dL). O equilíbrio do cálcio muda durante os estágios da vida e é determinado pela ingestão dietética de cálcio, absorção intestinal de cálcio e reabsorção renal.

As principais causas de hipercalcemia são aumento de reabsorção óssea devido a altos níveis de PTH ou o aumento da absorção intestinal de cálcio devido a altos níveis de vitamina D. Níveis aumentados de cálcio sérico podem enfraquecer os ossos, levar à formação de cálculos renais e interferir nas funções do coração e do cérebro. O status de cálcio depende de diversos fatores, incluindo a forte influência genética, com estudos indicando que a variação total devido aos efeitos genéticos está entre 50 a 78%.

O receptor de deteção de cálcio (do inglês calcium-sensing receptor, CASR) responde a alterações no cálcio extracelular, baixos níveis de cálcio resultam em sinais do CASR para aumentar a secreção de PTH na glândula paratireóide e diminuir a secreção de calcitonina da tireoide. O PTH estimula a mobilização de cálcio dos ossos, a absorção de cálcio no intestino e a reabsorção no rim. Já o aumento de cálcio resulta na supressão de PTH e estimulação da liberação de calcitonina por meio de sinais do CASR. A calcitonina reduz a captação de cálcio no rim e estimula a deposição de cálcio nos ossos.

Em um grande estudo, amplo de genoma (sigla do inglês GWAS), com mais de 12 mil indivíduos, encontrou-se associação significativa no locus CASR (em 3q13). O polimorfismo mais significativo nas meta-análises combinadas e europeia é o rs1801725 e, explica 1,26% da variância no cálcio sérico, sendo que cada alelo T leva a aumento de cálcio sérico, o alelo T apresenta a frequência de 16,76% em cortes européias. 

O polimorfismo, rs1801725, codifica uma variante missence no exon 7 do gene CASR, que leva a uma alteração de aminoácido não conservativo, substituindo a serina por alanina. Esta alteração pode influenciar diversas funções do CASR, como transdução de sinal, tráfego intracelular e expressão da superfície celular, portanto influenciando o tráfego intracelular após ativação do CASR pelo cálcio extracelular. O rs7481584 é um SNP intrônico de CARS. CARS codifica uma cisteinil-tRNA sintetase e está localizado dentro do domínio do gene impresso de 11p15.5. Esta região está ligada à síndrome de Beckwith-Wiedemann, que está associada à hipocalcemia e hipercalciúria.

Outros loci também foram relacionados ao cálcio sérico ligados ao metabolismo ósseo e controle endócrino do cálcio. No consórcio GEFOS, os polimorfismos rs1801725 no gene CASR e rs780094 no gene GCKR foram associados a densidade mineral óssea na coluna lombar, o rs1570669 no CYP24A1 no colo do fêmur e rs1550532 no DGKD na coluna lombar e no colo do fêmur. Já para os fenótipos endócrinos, rs1570669 no CYP24A1 foi associado a menores concentrações de PTH e rs1801725 no CASR com maiores concentrações de PTH e menores concentrações séricas de fosfato.

O rs1570669 é um SNP intrônico do CYP24A1. O CYP24A1 codifica uma enzima do citocromo P450 que hidroxila 1,25-(OH)2D, em metabólitos direcionados para degradação e parece ser um dos reguladores centrais do metabolismo do 1,25-(OH)2-D. O CYP24A1 é altamente regulado por seu próprio substrato 1,25(OH)2-D, bem como pelo PTH. Evidência implicam rs1570669 (CYP24A1) na via da vitamina D: sua associação com concentrações séricas de cálcio e PTH, sua expressão seletiva no túbulo proximal onde ocorre o metabolismo de 1,25(OH)2-D, e que mutações de perda de função do CYP24A1 causam hipercalcemia induzida por vitamina D em crianças (hipercalcemia infantil idiopática). 

O polimorfismo rs780094, locus GCKR, no cromossomo 2, está localizado no intron 16 do GCKR e pode influenciar indiretamente as concentrações de cálcio por meio de sua associação com os níveis de albumina.

O rs10491003 no cromossomo 10 está localizado dentro de um longo RNA não codificador com GATA3 como seu gene mais próximo pode influenciar a expressão deste gene. GATA3 codifica um fator de transcrição GATA envolvido na linfopoiese de células T, morfogênese renal e vestibular e desenvolvimento e diferenciação da glândula paratireoide e dos epitélios de transporte de cálcio, estando implicado em distúrbios monogênicos do equilíbrio de cálcio. 

O gene DGKD (rs7336933) codifica a enzima diacilglicerol quinase delta, um membro da família de enzimas diacilglicerol quinase (DGK). O splicing alternativo do gene DGKD resulta em duas isoformas, que diferem em seus perfis de expressão e mecanismos regulatórios. DGKs desempenham um papel importante na transdução de sinal modulando o equilíbrio entre o diacilglicerol (DAG) e o ácido fosfatídico (PA), importantes segundos mensageiros em cascatas de sinalização. DAG está envolvido na sinalização de cálcio em células paratireoides. A sinalização CASR influencia os níveis intracelulares de DAG em cardiomiócitos. 

A variabilidade genética tem impacto nos níveis de cálcio sérico, e afetam tanto a regulação endócrina quanto a densidade mineral óssea e o metabolismo da vitamina D. Essa variação genética pode ajudar a identificar indivíduos com maior predisposição a condições de desequilíbrio. Por exemplo, indivíduos com variantes no gene CASR podem ser monitorados para evitar complicações como hipertensão e arritmias cardíacas, enquanto aqueles com variações no CYP24A1 podem ser orientados quanto ao uso adequado de suplementos de vitamina D para prevenir a hipercalcemia induzida. 

A integração de testes genéticos, como o BioNutrientes da Biogenetika,  no manejo da saúde óssea e cardiovascular pode aprimorar significativamente a precisão no diagnóstico, personalizar tratamentos e otimizar a prevenção de doenças relacionadas ao desequilíbrio do cálcio, promovendo uma abordagem de saúde mais preventiva e individualizada.

*Conceito de polimorfismo: são as variações na sequência de DNA que podem alterar as proteínas produzidas pelo organismo podendo gerando impactos para as vias envolvidas, metabolismo e saúde de quem as porta. Para ser considerado um polimorfismo esta variação precisa ser de no mínimo 1% em uma população.

REFERÊNCIAS

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LOPES, Katharina da Silva; ABE, Sarah Krull. Polymorphisms Contributing to Calcium Status: a systematic review. Nutrients, [S.L.], v. 13, n. 8, p. 2488-2525, 21 jul. 2021. MDPI AG. http://dx.doi.org/10.3390/nu13082488
O’SEAGHDHA, Conall M.; WU, Hongsheng; YANG, Qiong; KAPUR, Karen; GUESSOUS, Idris; ZUBER, Annie Mercier; KÖTTGEN, Anna; STOUDMANN, Candice; TEUMER, Alexander; KUTALIK, Zoltán. Meta-Analysis of Genome-Wide Association Studies Identifies Six New Loci for Serum Calcium Concentrations. Plos Genetics, [S.L.], v. 9, n. 9, p. 1-13, 19 set. 2013. Public Library of Science (PLoS). http://dx.doi.org/10.1371/journal.pgen.1003796.